‘Nossos banheiros não são tão seguros quanto pensamos’, diz escritora

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) — A escritora americana Chelsea Wald tem se dedicado nos últimos anos a estudar e divulgar a nova ciência dos banheiros. O foco dessa área de pesquisa é a privada, mas os inovadores desejam mudança completa, que vai além da peça de cerâmica que, por mais que os humanos tentem esconder, é central na nossa vida — a revolução deve ir, literalmente, pelos canos e renovar todo o sistema.
O trabalho de Wald já a levou para diversas partes do mundo para experimentar…banheiros. Agora, ela lança o livro “Pipe Drams — The Urgent Global Quest to Transform the Toilet” (algo como: sonhos do encanamento — a busca global para transformar o banheiro), ainda inédito em português.

“Acho que ninguém que estudou comigo na escola pensaria que eu seria a pessoa a escrever sobre banheiro, ou cocô”, diz a jornalista em entrevista por videoconferência de sua casa na Holanda, onde vive atualmente com a família.

“Mas escrevendo sobre esses assuntos eu posso falar sobre todos os temas que são caros para mim, como saúde e ambiente.”

Primeiramente, precisamos reconhecer que o atual banheiro padrão ouro — um vaso de cerâmica autolimpante com uma descarga que despeja água limpa e carrega os dejetos depositados ali pelos encanamentos até uma estação de tratamento de esgoto — não é mais suficiente. O mecanismo, que já possui cerca de 100 anos de existência, definitivamente precisa de uma renovação.

“Nossos banheiros não são tão seguros quanto pensamos. O sistema, na verdade, esconde isso de nós, e ficamos satisfeitos. Se para um sistema ser considerado seguro ele precisa garantir que o conteúdo da privada chegue com segurança ao tratamento, bem, cerca de metade do planeta não pode contar com isso”, diz Wald.

“Se pensarmos ecologicamente, mesmo quando esse sistema que conhecemos funciona corretamente, ainda não é saudável de uma perspectiva planetária”, acrescenta.

Com as tecnologias atuais, uma parte dos remédios e até drogas ilícitas que as pessoas usam e liberam por fezes e urina vão parar nos rios, afetando diretamente a vida aquática.

Em “Pipe Drams”, Wald consegue mostrar quão complexo é o tema, desde nossa relação problemática e recheada de tabus com cocô e xixi, que inibe a busca por soluções, até problemas mais graves, como a defecação aberta — quando as pessoas fazem as necessidades fora de um banheiro, prática que coloca todos na comunidade em risco pelo potencial de transmissão de patógenos que as fezes possuem.

“Não é um desafio para o futuro, estamos enfrentando problemas agora. E não diz respeito só à tecnologia, existem as dimensões sociais e políticas também”, diz a jornalista.

No Brasil, a defecação aberta é praticada por menos de 1% da população, segundo relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), lançado no início deste mês.

Mas cerca de 10% da população brasileira ainda depende de instalações precárias para fazer as necessidades. Dentre esses banheiros improvisados, as latrinas (casinhas de madeira com um buraco no chão), são um tipo comum. Este repórter, quando criança, dependeu de latrinas em uma favela de Curitiba e sentiu na pele o risco que eles representam após contrair uma infecção agressiva.

Wald diz que boa parte dos lugares mais carentes de infraestrutura, como é o caso do Haiti, aposta em um saneamento baseado em contêineres — um banheiro com um recipiente que é retirado por algum serviço particular para que os dejetos tenham um fim mais seguro.

A pandemia pode ser educativa, diz Wald. “A melhor resposta à pandemia foi o distanciamento social. Para doenças relacionadas ao cocô, no entanto, a solução é muito mais fácil. Usar banheiros seguros é distanciamento social — do cocô”, escreve a autora.

“Pipe Dreams” é uma introdução completa para quem deseja conhecer a história do saneamento e, principalmente, como podemos — e devemos — buscar um futuro no qual cocô e xixi viram recursos e ferramentas para conhecer mais sobre nossa saúde, usando tecnologias avançadas, que podem trazer os chamados banheiros inteligentes, ou simplesmente dando maior acesso à tecnologias simples e baratas que podem transformar e salvar vidas.

Fonte Click PB

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